Recém-casados, Adalberto e Narcisa estavam praticamente em lua-de-mel. A esposa chega um dia e o convida para um jantar com seu chefe, e alguns seletos convidados. Ela trabalhava em um grande banco de investimentos, ele era professor de educação física. Titubeou no começo, mas vamos lá vai, tem que dar uma força para a carreira da patroa.
O transtorno já começou quando soube que ia ter que ir de camisa e calça social, justo ele que só usava bermudas e camisetas. Mas encarou bravamente, e lá foram pro tal jantar.
O evento era em um duplex gigante no bairro mais caro da cidade. Chegando, o anfitrião deu um caloroso abraço na sua esposa, e praticamente o ignorou.... Pensou: "Começamos bem". Além do chefe e sua respectiva, uma senhora com seus cinquenta e tantos e quilos de botox e silicone, estavam mais dois casais, duas colegas de trabalho com seus maridos.
O pré jantar até que foi tranquilo, tirando o chefe que ficava olhando Narcisa com aquela cara de "How are u doing ????" Jantar servido, o prato principal era peixe. Ele detestava peixe, e trouxeram o bichão lá, inteiro, com uma fruta na boca, olhando pra ele.... Provavelmente pensava: "É meu amigo, eu to na roça, mas você também não está muito melhor". Comeu uma fatia, que ficaria conversando com ele nos próximos dias e ainda por cima lhe renderia pesadelos com peixes, frutas e chefes tarados.
Conversa vai, conversa vem, e vem a fatídica pergunta:
- E então Adalberto, o que faz da vida?
- Ele trabalha com esportes, responde Narcisa
- Que ótimo, marketing esportivo? Gestão ?
- Não, professor de educação física mesmo.
Olhares constrangidos de lado a lado. Também pudera, um dos maridos era diretor do banco, o outro empresário. Depois do jantar, Adalberto ainda teria que encarar um papo agradabilíssimo com os dois, sobre assuntos como melhores investimentos, milhões de reais, imóveis e Rogerio Ceni, justo ele, que vinha de uma família de corinthianos.
Lá pelas tantas a esposa finalmente resolve ir, não antes de gastar exatos 45 minutos nas despedidas, 10 dos quais dedicados ao chefe, mais carinhoso ainda depois de taças e taças de um vinho cujo preço provavelmente faria Eike Batista corar. Vai o caminho inteiro até sua casa mudo, pensando se ia ou não reclamar com Narcisa, dado que ela o deixou jogado aos leões enquanto conversava com as colegas animadamente em outro canto do apartamento.
Resolveu chegar em casa e discutir a relação. Juvenil, não sabia ainda do perigo que corria. Não sabia que não se ganha uma discussão com mulher alguma. Não sabia que anos de evolução programaram os cérebros das mulheres com um potente antídoto contra o maior porte físico masculino: a Defesa Chewbacca!
Abre parênteses.
A Defesa Chewbacca só foi recentemente mapeada, o video do estudo inicial sobre o assunto pode ser visto aqui. De forma bastante superficial, consiste no poder feminino de apresentar em discussões argumentos sem o menor sentido, relacionados ou não ao tema em questão. Além disso, as mulheres são capazes de sustentar e manter esses argumentos sem sentido pelo tempo que for suficiente, imobilizando o acusante de tal forma que pode inclusive trazer sérias complicações neurológicas.
Mas o maior poder da Defesa Chewbacca é transformar o acusante em acusado, o levando eventualmente a inclusive assumir toda a "culpa". Recentes estudos no campo de Teoria dos Jogos provaram que a melhor estratégia para os homens vítimas da CD (Chewbacca Defense, é o termo técnico) é desistir o quanto antes, minimizando o prejuízo.
Fecha parênteses.
- Narcisa, não gostei do que você fez hoje, me deixou totalmente deslocado no meio daquelas cobras. E tem mais, seu chefe está dando em cima de você. E eu detesto peixe !
Narcisa fica vermelha, enfurecida. Suas camadas mais primordiais do cérebro ativam instintivamente a CD:
- Adalberto, do que você está falando? É sempre assim, quando surge algo importante na minha vida você resolve sabotar. Você se sente ameaçado por meu sucesso profissional.
- E tem mais - ela continua - o peixe aqui é simbólico ! Representa seus medos, sua insegurança. Porque você já me contou, não gostava de pescar, e está projetando esse seu trauma em nossa relação.
Adalberto a essa hora já não sabe de onde veio o papo do peixe, nem que tinha medo de pescar
- Sabe Adalberto, eu me casei com você porque achei que o teria como meu companheiro, mas se você não estiver disposto a superar algumas barreiras, a dar aquele passo extra...
Passo extra? Que p$$% é essa, ele pensa;
- A se esforçar para que tudo dê certo, é melhor a gente repensar tudo isso. Enquanto você fica aí reclamando do peixe, crianças morrem de fome, o mercado imobiliário entra em colapso, o Pato perde aquele penalty. E o Pato hein Adalberto ???? Você quer falar do peixe ou do Pato?????
O monólogo se estende por mais um tempo. No final, Adalberto dorme no sofá, estupefato. Lá pelas 6 da manhã ela a chama de volta pra cama, para mostrar como é magnânima e compreensiva. Ele pede desculpas por tudo, sem saber muito bem o que fez de errado.
Muito legal. Ri muito. Parabéns.
ResponderExcluir